sexta-feira, fevereiro 20, 2009

ECO-IDEIAS 1970

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29-4-2000

A CHAMADA «LUTA BIOLÓGICA»:
MAIS UM EQUÍVOCO?

Palavras-chave para pesquisa na Internet:
adubos
agricultura biológica
agricultura química
aves
Bayer
biocidas
biocídio
Comissão Internacional de Luta Biológica (1956)
DDT
desequilíbrios biológicos
ecologia dos solos
F.A.O.
fitopatologia
fungos
insectos
luta biológica
mamíferos
parasitas
pesticidas
poluição química dos solos
produtos de síntese
pulverizações
Rodolia Cardinalis (Joaninha)
saúde pública
tratamentos fitosanitários

A fitopatologia que se ensina nas escolas superiores é mais semelhante a uma indústria de guerra do que a uma arte de paz.
Os técnicos agrários, não contentes em ter transformado a agricultura numa tecnologia mecânica, fizeram dela, de há um século para cá, uma indústria de guerra perpétua.
A corrida para a destruição em que adubos e pesticidas meteram a agricultura parece não ter saída nem alternativa dentro do sistema cultural vigente. Dentro das vigentes ideologias do desenvolvimento e do crescimento económico indefinido. Os técnicos agrários da ideologia F.A.O. só vislumbram a guerra cada vez mais encarniçada, só a destruição cada vez mais raivosa, só a violência cada vez mais in extremis.
Mas como a destruição engendra destruição e a violência engendra violência, eis que o beco sem saída da agricultura transformada em «indústria pesada» se oferece aos olhos esbugalhados de agrários e técnicos como o panorama do fim do mundo, do fim da Terra.
Em desespero de causa, vem o técnico mais ardiloso e descobre, no laboratório, aquilo que se quer dar como alternativa para os pesticidas e a luta química em geral : vem o técnico e descobre a «luta biológica». Reconhecendo que a guerra química está perdida, reconhecendo que não é possível continuar queimando as terras e, ao mesmo tempo, exigindo delas alimento (absurdo que só os autênticos paranóicos continuam defendendo), vem um fitopatologista mais esperto e «descobre» a «luta biológica». Não desiste da palavra «luta» mas agrada-lhe a palavra biológica», já hoje mágica, à medida que a escalada biocida prossegue.
Mas a chamada «luta biológica» (alternativa reformista dentro do sistema e não uma alternativa  para fora do sistema ecocida), temos de novo a asneira tecnocrática em campo, a desmedida megalomania do biotécnico supondo que pode pôr e dispor da Natureza a seu belo prazer, que pode pôr ordem nas coisas naturais, que pode sobrepor-se à ordem do Universo, dominar, esmagar, tripudiar, etc., como sempre tem vindo a fazer, com grande orgulho...científico.
É bom que o militante ecológico medite no discurso dos da «luta biológica» que,em desespero de causa, reagem vendo perdida a guerra que a hecatombe química trava nos solos mas não querendo desistir da sua supremacia e domínio sobre a Natureza.
Os textos são colhidos ao acaso das leituras e constituem apenas um primeiro apoio ao estudioso das alternativas ecológicas para a agricultura. É bom que se analise e discuta a ideologia que preside à destruição ecológica dos solos.
Talvez assim, conhecendo o discurso e a ideologia, o discurso da ideologia, se possa reconstruir a ideologia criadora da Idade Solar que, entre partos e prantos, se aproxima para a próxima e venturosa geração que terá a felicidade de a viver.
Comecemos com um texto lido há anos num jornal de Moçambique - Notícias da Beira - e que, no seu anonimato, dá a nota do que pode ser um discurso oficial da FAO sobre o assunto, nomeadamente para consumo no Terceiro Mundo.
Transcrevemos:
«A luta biológica consiste em destruir os seres nocivos, utilizando, para isso, os seus inimigos naturais.
«O agricultor, na luta contra os inimigos das culturas, dispõe de numerosos auxiliares - insectos, aves, mamíferos, etc. - e para evitar a sua desaparição é preciso: protegê-los e facilitar a sua reprodução.
«A partir de 1945, ano em que os novos produtos de síntese fizeram a sua aparição, o emprego maciço e inconsiderado destes foi, em muitos casos, responsável por desequilíbrios biológicos ; assim, admite-se que o uso generalizado de especialidades comercias à base de DDT em pomares de macieira, tenha favorecido a multiplicação do aranhiço vermelho.
«Os agricultores, devido à virulência, quase espontânea, de parasitas que antigamente não exigiam tratamentos particulares, encontram-se agora perante o problema, frequente, de necessitarem de efectuar novas e dispendiosas pulverizações ou polvilhações; deve-se procurar empregar, para evitar estes inconvenientes, produtos específicos capazes de destruir o parasitas, respeitando o equilíbrio biológico .
«No caso contrário, no entanto, poderá dar-se a ruptura desse equilíbrio, facilitando a população de novos parasitas e tornando necessário aumentar o número de tratamentos ; cai-se, assim, num círculo vicioso e, para o evitar, recomenda-se:
alternar os produtos activos
evitar as misturas complexas e de acção duvidosa
e evitar os tratamentos excessivamente intensos e pouco intervalados .
«O interesse da luta biológica chamou desde há muito a atenção dos serviços de investigação agronómica .
Em 1956 foi criada uma Comissão Internacional de Luta Biológica para permitir aos investigadores confrontar pontos de vista e coordenar a orientação dos trabalhos.
É frequente que a introdução acidental num país de um parasita originário do estrangeiro se faça com virulência muito inferior à observada no país de origem; houve, portanto, ruptura do equilíbrio biológico.
«Os investigadores, neste caso, procuram:
descobrir o insecto entomógrafo capaz de destruir o parasita no país de origem
introduzi-lo
e permitir a sua alimentação e estimular a sua dispersão.
«Um dos exemplos mais conhecidos é o da cochonilha australiana, cujo inimigo mais activo na Austrália é uma joaninha, a Rodolia Cardinalis; a disseminação e dispersão deste insecto na região mediterrânica é perfeita.
«Um himenóptero, o Alphelinus mali, foi importado da América do Norte com resultados satisfatórios no combate ao pulgão lanígero.
«O emprego dos meios naturais pode, em suma, resumir-se da seguinte forma:
utilização máxima dos entomófagos no seu habitat original e introdução e aclimatação, seguida de dispersão, de depredadores de origem estrangeira.
«Pode afirmar-se, em conclusão, que a luta biológica apresenta um interesse primordial, pois permite efectuar economicamente a protecção das plantas cultivadas, limitando, em certa medida, a aplicação de tratamentos dispendiosos.»

Por seu turno, o boletim da Bayer, perguntava um dia se a luta biológica apresentará perigos para a saúde pública. Parece recear efectivamente a concorrência e que a luta biológica não está inocente , como comprova o texto que a seguir se transcreve :

«Pode recorrer-se à «luta biológica» sem se pensar nos perigos daí decorrentes para o homem e animais de sangue quente? - pergunta, inquieta a Bayer, que acrescenta: « A pergunta tem a sua razão de ser, mesmo para este processo em que não entra um grama de qualquer produto químico, mas em que se lançam insectos contra insectos, fungos contra insectos, bactérias contra insectos, etc.
«O fungo Entomophthora coronata, aplicado na Califórnia contra um piolho da luzerna, mostra-se tão perigoso contra estes insectos como, provavelmente, como origem de infecções, contra o homem.
«De facto, os animais de um laboratório experimental em que se aplicou este fungo, mostraram uma série de sintomas graves.
«Também o fungo Beauveria bassiana, uma espécie muito usada em luta biológica,originou agora, nos próprios seres humanos, dores de cabeça, fadiga, febre, dores nas articulações, etc.
«Em ensaios toxicológicos conduzidos com ratos de laboratório, a junção de doses altas dos esporos do fungo à ração, durante alguma semanas, originou diarreias, perda de peso a até casos mortais.
Um caso extremo de «acção secundária deste fungo , dar-se-ia quando, ao lidar com ele, ocorresse uma «explosão» do pó de esporos.»
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quarta-feira, 11 de Dezembro de 2002

EVOLUÇÃO E MUTAÇÃO DO CRITÉRIO CRÍTICO (*)

29/Abril/1970 - A experiência é conhecida e alguns a terão descrito já.
Quando um dia contactamos uma obra, um autor e sentimos que, a partir dele, tudo ou quase tudo se modificou na nossa óptica, na nossa estrutura mental, na nossa sensibilidade, no nosso critério, na nossa mentalidade ou maneira de ver as coisas ou mundividências, dá-se o que alguns podem considerar súbita iluminação e outros conversão (quase) mística. Trata-se, pelo menos, de uma mutação.
Por essa experiência se explica que o nosso gosto evolua: o que ontem nos parecia bom, hoje aparece-nos medíocre. Ou o que ontem dificilmente aceitávamos, hoje banalizou-se. Passa-se com a arte - em especial com a música -, passa-se com a poesia e a literatura, com as ideias, com as modas e com tudo o que depende mais da intuição ou da imaginação do que do raciocínio e da razão. O nosso gosto evolui mais do que a nossa inteligência. Informações esquecem-se, mas experiências marcam-nos, vão-nos marcando e fazendo com que a nossa personalidade de hoje já não seja a mesma de amanhã.
Este gosto, desejo e necessidade de mudar, de evoluir, de melhorar ou modernizar a nossa óptica (a nossa sensibilidade), sentimos que é um facto sempre que se nos revela um novo autor ou uma nova obra de quem afirmamos: "Depois dele, o dilúvio." Ao pé dele, muita coisa empalidece e envelhece.
É isso o que um contacto de dias com os textos e autores da Prospectiva nos dá: a sensação de que muita coisa ficou, irremediavelmente, ultrapassada e morta. De que outro agora é o nosso ponto de arranque e o nosso critério de ajuizar sobre um filme, um livro, um quadro, e muito diferente a terminologia que passamos a aceitar.
Prospectiva é, no fundo, o que sempre acontece quando nos acontece mudar , sofrer a experiência de uma nova fase da existência.
Prospectiva é o que acelera e torna possíveis as mutações do nosso espírito, o princípio geral que não deixa envelhecer o espírito e morrer intelectualmente,
No fundo, Prospectiva é o que procuramos quando procuramos em que consiste a Modernidade, o Progresso, a Civilização, a Revolução, o Avanço, o Movimento, a Humanização do Homem. A Liberdade.
Descontentes com as filosofias de ontem, que tão rapidamente passam a filosofias de ante-ontem, atravessamos as de hoje - dadaísmo, surrealismo, existencialismo, persona-lismo, estruturalismo, marxismo, realismo fantástico - e es-sas outras sempre acabam por não ser suficientes, ou por en-velhecerem também.
Aos que procuram respostas nos sistemas filosóficos, nas escolas e correntes estéticas, a Prospectiva propõe a ultrapassagem contínua, porque a filosofia de amanhã será, com certeza, todas essas mas não será nenhuma delas. Porque o tempo - movimento e mudança - é o princípio que torna o presente já passado e o futuro a única coisa sempre presente.
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(*) Este texto de Afonso Cautela deverá ter permanecido inédito, pois mais também não merecia. Estes anos 69,70 e 71, a contas com uma coisa inexistente – a Prospectiva -, foram de grande confusão na minha cabeça! O princípio da relatividade de tudo andava por perto...
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terça-feira, 10 de Dezembro de 2002-scan

A PROSPECTIVA E O CAOS DAS TEORIAS

2-5-1970 - Prospectiva não é ficção (política, história ou ciência-ficção), não é antevisão, hoje, com o auxilio da fantasia mais ou menos delirante e de computadores mais menos electrónicos, do que irá passar-se amanhã, e de como viveremos.
Prospectiva não é, tão pouco, Futurologia.
Prospectiva é uma atitude de espírito que consiste em nos colocarmos num ponto exterior ao presente - um ponto no espaço e no tempo - de modo a vermos esse presente perspectivado, devidamente perspectivado.
Por exemplo: um indígena australiano que olhasse os costumes ocidentais - se lhe fosse dada essa experiência - estaria situado num ponto prospectivo.
O próprio europeu de hoje que lance um olhar para os costumes da Inquisição - digamos, a exemplo - verificará a que distância se encontra desses rituais e situa-se, portanto, num ponto prospectivo de observação.
O mesmo em relação à sociedade actual: conseguir em relação a ela um distanciamento - no espaço e no tempo - que permita perspectivar uma auto-crítica, é posição prospectiva.
Muitos, não há dúvida, são os aspectos deste mundo em que já é possível imaginar o que vai ser um juízo dos homens de um futuro próximo. Quanto mais segura, mais nítida e mais profunda for essa perspectivação, mais prospectiva será a atitude de espírito que a promove.
Supunhamos, por exemplo, o que irá pensar daqui a 10 anos um homem que reveja a maioria dos filmes americanos produzidos hoje; e que leia os nossos jornais; e que se espante com as polémicas entre ismos ou teorias.
"Como era possível" - dirá o homem do futuro e o que é já hoje contemporâneo do futuro - "que eles, perante, por exemplo, o mesmo filme, manifestassem opiniões tão opostas?"
"Como é possível que não houvesse ainda meios de medir matematicamente o mérito de uma obra - filme, livro, peça, romance, poesia - e tal medição, feita com palavras destituídas de rigor e mergulhadas na mais crassa subjectividade, desse motivo a tão odiosos conflitos de pessoas?"
Na verdade, um dos costumes da cultura actual que mais irá ferir a sensibilidade do homem futuro é esse da crítica, que ao homem prospectivo de hoje aparece já como um instrumento vão de análise e medida, um instrumento imperfeito e indigno da nossa época de tecnologia ultra-aperfeiçoada, de pretensos rigorismos, de cientifismo enfatuado.
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sexta-feira, 14 de Junho de 2002
6353 caracteres vitrac-literatu-manifest-rascunhos

intuições ac -  para um manifesto literário da modernidade - radicalizar a perspectiva para uma teoria sem dogma da crítica literária para uma ciência dialéctica ou não dogmática da criação literária

A LEI DA RELATIVIDADE EM LITERATURA

2/Maio/1970 - Em «Vítor ou as Crianças no Poder», Roger Vitrac explora uma situação que viria a fazer lei em toda a sensibilidade moderna. Talvez sem se dar por isso, Vitrac utiliza ardilosamente um estratagema que viria a estar na origem de muita vanguarda literária, de que é expoente máximo a obra inalienável, indivisível (toda a obra) de Samuel Beckett: um posto de observação inédito para o autor, ou para a personagem que na história, no poema, na obra, é o alter ego do autor.
No caso de «Vítor ou as Crianças no Poder», esse posto de observação é o da experiência infantil, em oposição à dos adultos; mas outros postos de observação seriam descobertos: a experiência do louco, do toxicodependente, do doente profundo, do «out-sider», o do chamado «selvagem» [--->>]
Se não foi descoberta e teorizada pelos surrealistas, esta lei da relatividade -- princípio diabólico por excelência -- foi, pelo menos, largamente praticada por autores surrealistas, (entretanto rotulados por André Breton sob a etiqueta prática de «humor negro» ou «non sense») que conferiram ao conceito «experiência em literatura» uma latitude e complexidade até então desconhecida.

DESARMONIA DOS CONTRÁRIOS

Quer se trate de uma idade contra outra idade (a criança contra o adulto, no exemplo de Roger Vitrac), de um grupo contra outro grupo (o colonizado contra o colonizador, o negro contra o branco, o judeu contra o nazi, o aluno contra o professor), de uma classe contra outra classe (o proletário contra o pequeno-burguês), de uma vivência contra outra vivência (o doente contra o sadio, o anormal contra o normal, o «out-sider» contra o instalado, o drogado contra o imune, o celibatário contra o casado, o infractor contra o legal, o criminoso contra o polícia, a mulher contra o homem...), uma conclusão provisória, na busca de uma lei geral, pode ser enunciada: a Modernidade (ou Prospectiva) em literatura, vem quase sempre aliada à ideia de uma resistência às normas estipuladas, aos valores hierarquicamente impostos, às autoridades executivas, à ordem reinante, instalada e considerada até aí -- até surgir o texto -- imutável, indiscutível.
A Modernidade -- a existir -- vem sempre ligada a uma estética do Obsceno, quer dizer, uma quebra de regras e tabus e antinomias e rótulos e classificações.
Na melhor das hipóteses, Modernidade é uma literatura de marginados, excluídos, segregados pelos «status quo» vigentes.
A esta luz, o fantástico em literatura aparece apenas como um posto mais diferente de observação.
Entre os postos de observação «diferentes» que se tornaram clássicos na chamada literatura de ficção científica, está o de ver a Terra do Planeta Marte, o que, em princípio, gera uma «perspectiva de escala» obviamente interessante e poética.
«Vítor ou as Crianças no Poder» não será um dos mais frisantes nem dos mais conscientes, mas é exemplo significativo de modernidade ou prospectiva literaria; um claro exemplo de como também o humor resulta de uma alteração de perspectiva epistemológica e de novos postos de observação da realidade, de novas ópticas além das convencionais; um exemplo, pois, de que o humor não é uma evasão, denegação ou sonegação do real mas a descoberta nele de insólitos, inéditos ou originais e mais profundos aspectos.
A revolução, modernidade ou prospectiva literária tem em Roger Vitrac um cultor brilhante, porque ele conhecia, ao menos de intuição, os mecanismos que estabelecem a desordem e denunciam, portanto, determinada ordem estabelecida, seus crimes e suas contradições.
Quando se procura uma nova literatura -- uma literatura prospectiva[?????] -- é fundamental esta questão das ópticas possíveis. Dela é corolário o sentido da relatividade que vem substituir o do absolutismo. A nova literatura é dialéctica, por oposição aos monolitismos dogmáticos, aos sistemas metafísicos, imutáveis e inamovíveis. É contra a imutabilidade dos dogmas (a ciência, incluindo a ciência literária, instituiu-se, como se sabe, em Dogma maior da religião contemporânea). É pela mudança, pelo movimento, pela INSTABILIDADE ([????].
Se aqui fica assinalado o caminho para uma lei geral da literatura e da criação, uma semântica do imaginário humano, então acredito que a Estética do Obsceno seja o campo certo da criação poética florescer, o método eficaz de não criar dogmas a partir de teorias, de fazer caminhar e encaminhar para a ciência (dialéctica) a análise crítica ou análise crítica literária.
A literatura de novas ópticas é subversiva no sentido em que vem afirmar haver mais mundos e mais «marias na terra», dando a palavra aos que até agora a não tinham, ao Terceiro, Quarto e Quinto Mundo dos indivíduos e dos povos: os deserdados, os heréticos, os marginados, os humilhados e ofendidos, os excluídos, os eternamente vencidos, aquelas a quem a própria condição de «submundo» lança sobre eles designações geralmente pejorativas, rótulos ou etiquetas que a medicina, a sociologia, a psiquiatria, a política (em suma as autoridades possidentes) se encarregam de inventar: criança, toxicodependente, louco, doente profundo, anormal, out-sider, anarco-libertário, homossexual, negro, colonizado, presidiário, interno dos hospitais, ------>>>>>>>>
A perspectiva de escala em literatura é a descolonização em sentido lato, é o Terceiro Mundo da Literatura.
--temos, em resumo, a propósito de Roger Vitrac e do calão (os dois últimos textos a serem teclados para esta manifesto aberto), algumas noções básicas -- a sublinhar eventualmente nesses textos -- ao desvendar os mecanismos e dispositivos que regem a imaginação criadora de ontem, de hoje, de sempre:
relatividade
estética do obsceno
resistência de minorias
descolonização
novas ópticas
epistemologias múltiplas
mudança
ciência dialéctica versus ciência dogmática
terceiro mundo dos marginados
lumpen-prolariat
calão
underground
bas-fonds da sociedade
pop-literatura
alter-ego
autosider
non-sense
humor negro
status quo
establishment
descolonização literária
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1-3. 73-04-12-ie- quarta-feira, 4 de Dezembro de 2002-scan

A CONSCIÊNCIA ORIGINAL DA UNIDADE PERDIDA (*)

["Diário do Alentejo", 12/Abril/1973] - Que o mundo seja, todo ele e em matéria de lucidez crítica, um deserto, enfim: a gente já conhece, já não liga e passa.
Mas que as minorias, os raríssimos nos quais reside afinal a nossa derradeira esperança de homens ainda humanos, se passem, inopinadamente, para o campo da Abjecção, eis o maior e inominável desespero. Eis o maior motivo de pessimismo. Se as minorias são o sal da Terra, então só nos poetas, nos raros artistas e escritores e em alguns filósofos que tenham ainda um pouco de profetas residiria a nossa única e última esperança.
No meio do fanatismo das ideologias, no meio do obscurantismo que se desculpa de causa política, no meio da estupidez que se vangloria de "combater" tudo quanto seja vivo, se subsiste ainda um resto de esperança seria apenas para acreditar nos poucos e raros e últimos poetas que haja neste tempo e mundo.
Quer dizer: nos últimos que teimam em resistir, em manter a imagem do homem, o rosto humano do homem. "Liberté, couleur d'homme" (André Breton)

CONSCIÊNCIA OU PERSPECTIVA ECOLÓGICA

Ora a condição sine que non desse "rosto humano" e desse rosto vivo da vida, é a consciência ou perspectiva ecológica. É a noção intuitiva e consciente, calma mas exaltante, de que habitamos todos o mesmo planeta e o mesmo universo, de que tão importante é o homem na sua cama, na sua casa, na sua oficina de trabalho, na rua e no seu lugar de ócio, como o sol na sua rota cósmica, a árvore na floresta, o peixe no rio, a ave no céu.
Tão importante é a dor humana como a da ave ou da planta e tão importante o direito à subsistência material como o direito aos imponderáveis afectivos, imaginativos, artísticos, que qualificam a existência.
Poeta, é o que mantém, ainda, apesar de tudo e contra todos, essa consciência original da unidade perdida, o que teima em religar, pela palavra simbólica, esses elementos da mesma unidade e do mesmo esplendor cósmico que uma civilização atomizante, homicida, pulverizou e dilacerou.
Poeta, seria o que ainda não se deixou vencer pelas mitologias estúpidas, pelos alibis, pelos slogans do especialismo, do cientifismo, do tecnicismo, do divisionismo estéril e criminoso (criminoso porque estéril), estes sim, os principais mecanismos ao serviço de todas as ideologias no processo de aviltamento humano e de abjecção.
Ora a forma de colaboracionismo com a Abjecção hoje mais directa é destituir a consciência ecológica do seu lugar prioritário em relação a tudo o que se passa sobre o planeta terráqueo (só há uma maneira de se destituir a ecologia dessa prioridade: é mudar de planeta).
Porque ela (consciência ecológica) unifica onde os outros dividem, pesa e dignifica onde os outros segregam e degradam, porque ela defende a vida onde os outros atulham de química, porque ela respeita a criação onde os outros perpetram sistemático biocídio, porque ela sustenta o amor e a liberdade onde os outros, por um prato de lentilhas, se vendem à escravidão do consumismo e à histeria das violências paternalistas (incluindo a violência das cirurgias, das vacinas ou de outras a quem ninguém alude - porquê?).
Precisamente porque não é a vida de um só homem que me preocupa, mas a vida de todos os homens (incluindo os que morrem na Indochina com desfolhantes) é que me preocupa um metro quadrado de floresta e vice-versa. Porque me preocupa saber, por exemplo, se cada folha de papel em branco que é gasta (que eu gasto) a aproveitei no verdadeiro sentido ou se andei também a desperdiçar, com ela, floresta.
E preocupa-me saber isso, não só pela tal razão do ecossistema (todas as formas de vida são interdependentes, não sou eu que o digo, mas os cientistas); não só pela razão do ecossistema, que é razão mais que suficiente, mas porque só a consciência do Ecocídio é hoje consciência humana do homem, simultaneamente (pre) ocupada a nível universal e a nível individual.

POLUENTES E ANTI-POLUENTES

Quando falo de consciência ecológica (a tal que o “slogan" da palavra "poluição" tenta reduzir demagogicamente e também a um dilemazinho caseiro entre poluentes e anti-poluentes, a um problema portanto doméstico de lixo que se produz e de lixo que logo a seguir se varre, indo todos p’ra casa satisfeitos) penso em todos os homens que morrem porque o ambiente inumano os assassina, a curto ou longo prazo: ambiente que é a casa, a rua, a oficina, a cidade, o país, a cultura, a ideologia, o partido, todos os círculos concêntricos de que o indivíduo é o centro e dentro dos quais está inserido, envolvido e de que fatalmente é função.
Quando falo de meio inumano penso, por exemplo, num dos múltiplos capítulos que os palradores da "poluição" sistemática e cautelosamente omitem: as doenças de ambiente, que são quase todas, quer as congénitas como o mongolismo, quer as infecto-contagiosas como a tuberculose, quer as endémicas como o paludismo e a cólera, quer as degenerativas como o cancro e as cardíacas, quer as traumáticas como os acidentes de viação e os acidentes de trabalho, quer as tóxicas como... a toxicomania, etc etc.
A causa das causas é sempre de ambiente; os homens sofrem, porque o ambiente os faz sofrer, porque lhes cria carências - desde a fome ao afecto - , porque os aliena, porque os traumatiza, porque os violenta, porque os intoxica, porque os adoece, porque os tiraniza, porque os escraviza, porque centenas de anos de pseudo-civilização em vez de pura e simplesmente lhes humanizar o ambiente natural apenas lho degradou, sem, em troca, lhes dar um ambiente artificial mas humano.

ATENÇÃO SIMULTÂNEA AO TODO UNIVERSAL E AO LOCAL

O que a consciência ecológica permite (e só ela, especìficamente, permite) é a justa hierarquia de todos os seres viventes e da sua relacionação, sem segregações, sem racismos, sem favoritismos, sem padrões ou cânones paterna listas. Só a consciência ecológica é uma interconjugação de criaturas, é uma atenção simultânea ao todo universal e ao local, ao regional, ao individual.
Para amar a pessoa humana não tenho que desprezar a árvore, e simultaneamente, como nos quer fazer crer a odiosa ideologia que preside à Engrenagem de esmagamento e em que essa Engrenagem traduz todo o seu ódio à pessoa humana (como diariamente comprovará, quem lê jornais ou vê TV, sem necessitar que lho esteja aqui a comprovar), e em que essa Engrenagem induz até os melhores, até os mais sensíveis e dotados, os raros (antes) a manterem o sentido da unidade, da simultaneidade, da vida, dentro e contra a Engrenagem maciçamente homicida.

Má fé é acusar a Ecologia de preferir a árvore ao homem, quando a Ecologia é o esforço sobrehumano de resistência à vaga homicida que precisamente pretende sobrepor (e com que sanha, Deus nosso) ao homem e à árvore (aos seres vivos no seu conjunto) o objecto, o inerte, o inorgânico o químico, o material, o mecânico, o motorizado, enfim, toda a quinquilharia electro-doméstica, mecânico-tecnicista e burocrática que destitui, ofende, traumatiza, degrada, adoece e mata, e mata, e mata a vida (seja a de um homem seja a de uma ave, seja a de um planeta, já aconteceu à Lua, a tal dos poetas e românticos...).
Este o dilema e não, e nunca homem contra árvore.

PRÉMIO NOBEL DA LEGUMINOSA SECA

Quando o senhor Norman Borlaug, prémio Nobel da leguminosa seca, alto funcionário da FAO. e dizem que inventor da maior burla do século que é a pomposamente chamada "revolução verde" - um dos maiores obstáculos a que o Terceiro Mundo efectivamente se emancipe e faça a revolução que lhe aprouver -, quando o senhor Borlaug e outros senhores Borlaug gritam que histéricos são os defensores da Natureza porque condenam urbi et orbi a chacina do DDT (burla de primeira água perpetrada contra o Terceiro Mundo e a independência efectiva do Terceiro Mundo), quando vem um outro senhor funcionário da FAO, Suvana Puma, repetir a papel químico a fala do senhor Borlaug, e tudo isso em nome da fome que dizem combater (?) mas que efectivamente pretendem alimentar, é outro falso dilema, é mais capítulo do intérmino folhetim da demagogia para-científica e para-técnica.
Antes do DDT,  não resolveram o "problema da fome", porque não lhes interessava resolvê-lo e porque a fome é apenas um aspecto da totalidade ambiente que importa resolver; como não hão-de resolvê-lo é óbvio e vê-se, com DDT, antes e depois do DDT.
O que um ecologista deverá demonstrar aos senhores Borlaug, aos senhores prémios Nobel da pólvora, aos senhores todos servidores da Engrenagem (fomentadora da miséria e da Abjecção) é que Fome e DDT estão de acordo. O que um ecologista sabe - embora todos lhe cortem a fala quando ele o tenta - , é que o DDT é o último alibi de uma manobra - , "distrair e adiar" - típica da Abjecção para alongar a fome e o subdesenvolvimento. Assim como os terrores da explosão demográfica são outro sofisma, outro falso dilema, outro capítulo da romanesca demagogia melodramática para emocionar temperamentos nervosos.
A Engrenagem, a Tecnoburrocracia é uma das suas imensas, muitas, pesadas armas de agressão à Pessoa Humana, simultaneamente biombo da exploração que pratica na sombra.
A fome resolve-se de um dia para o outro, sem DDT. E só sem DDT se poderá resolver. A qualidade - para um ecologista - passa a ser condição sine qua non da quantidade. Já que tudo o mais está do outro lado, a nós fica a especialidade da qualidade.
Condição sine qua non para que a fome desapareça (mas não só a fome, todas as carências, doenças, sofrimentos, alienações, degradações, humilhações, aberrações e torturas) é que desapareça a Engrenagem homicida de tecnocratas.
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(*) Este texto de Afonso Cautela,  foi publicado no «Diário do Alentejo», (Beja), em 12 de Abril de 1973, graças à atenção e hospitalidade do meu querido e inesquecível amigo José António Moedas
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POSTULADOS 2012

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10/11/1998

IDEAL CIENTÍFICO OU PRAXIS NATUROLÓGICA? A ESCOLHA É NOSSA: LÉXICO(Palavras-chave directamente ligadas à Naturologia são assinaladas com um asterisco *):

Aleteia (verdade em grego)
Antropológico
Autores citados:
Barreiras dóxicas
Caixa de Pandora
Capacidade homeostática *****
Compacticidade vivencial *
Contemplação
Contexto da descoberta (Karl Popper)
Enciclopedismo *
Epistemológico
Estoicos
Galileu
Ideal científico
Indagação psicanalítica *
Obstáculo epistemológico
Ôntico
Ontológico
Paciência epistemológica *
Paradigma holocêntrico
Pensamento racional
Pressa moral *
Sapiencial
Sofistas
Soteriológico
Virtude*

AUTORES CITADOS:
Albert Camus
Aristóteles
Pitágoras *
Platão
San Juan de la Cruz (la noche oscura)
Santo Agostinho
São Boaventura
São Tomás de Aquino

SUBLINHADOS:
A dimensão trágica do eu.
A verdadeira sabedoria está no Logos
A vida é egofágica
Crença é factor propulsor
Há grande diferença entre o mundo da verdade e o mundo das opiniões.
Nada se perde, tudo se transforma.
Não podemos ser iconoclastas.
O ideal científico é uma categoria móvel
O logos está na base da verdade
O luxo da consciência
O meu presente está condicionado pelo meu passado
O poeta é um fingidor
O psiquismo é dinâmico
Perdemos a noção de que podemos aceder ao real

«Ciência sem consciência é ruína ou calamidade da alma.»
Se Rabelais é o autor deste axioma quase postulado, é caso para ficar a admirar duplamente o escritor de «Pantagruel» - obra monumental e profética da humanidade - tão ignorado dos cientistas mas que estaria mais certo numa história das ideias do que na história da literatura.
O referido aforismo de Rabelais bem pode conduzir-nos, como fio director, na leitura desta lição de Epistemologia.

Parece, de facto, que do ideal científico passámos, ano após ano, década após década, século após século, para o actual chafurdo do irreal virtual e do irracional virtual.
E a questão epistemológica interessante talvez seja esta: a actual abjecção vem na linha lógica e cronológica do ideal platónico - a pureza das ideias - ou resulta de um desvio e de uma perversão desse ideal?
Será o moderno chafurdo uma consequência inevitável dessa pureza inicial do Logos (a que se chamaria, nesse caso, puritanismo), ou aconteceu um processo degenerescente a que todas as civilizações se encontram submetidas? Teria acontecido à civilização helenista o que aconteceu a tantas outras que entraram também no seu ciclo de decadência ?(Vide teoria de Toynbee sobre os ciclos históricos).

OS FRUTOS DA CIÊNCIA MÉDICA

Pelos vistos - e revertendo de imediato à Naturologia - o que parece prudente é não avaliar a verdade pelos seus princípios programáticos - neste caso a caverna do senhor Platão - e avaliá-la antes pelos resultados. Diz a Bíblia dos cristãos: «Avaliarás a árvore pelo seu fruto.»
A Naturologia deverá adoptar este bíblico anexim como seu postulado orientador.
Haverá exemplo mais emblemático do que a Homeopatia? Segundo os esforçados investigadores da ciência oficial, aquilo é uma parlapatice (foi um tal François Jacob, que se diz Prémio Nobel, a lançar o anátema, a convite da revista «Science et Vie», que a D. Isabel Stilweel logo reproduziu, ipsis verbis, na revistinha que dirige, o magazine «DN»).
Segundo a prática milenar (porque a homeopatia não nasceu com Christian Friedrich Samuel Hahnemann (1755-1843) como continua a repetir-se por tudo o que é texto naturológico) , esta terapia resulta e ponto final.
Aliás, vendo um pouco mais de perto o fatídico incidente, o facto de a ciência médica ordinária não ver qualquer valor na pura energia de uma diluição homeopática, apenas assinala a sua triste miopia, aquela mesma miopia que levou outro cretino (Charcot?) a afirmar que nunca tinha encontrado a alma na ponta do seu querido bisturí.
Discordo do meu professor José Alves numa única afirmação sua:
«Não podemos ser iconoclastas.»
Tratando-se de salvar a pele ( e principalmente a alma) acho que não só podemos como devemos ser iconoclastas.
Os idola tribu, do senhor Bacon (Francis ou Roger?), são uma categoria sempre actual da epistemologia. E o nosso dever é derrubá-los. Aos ídolos, evidentemente.

A INDÚSTRIA DA DOENÇA

Por isso, o critério de verdade não é nem tem que ser tão puro como continua a querer-se e em Naturologia teremos que reabilitar o conceito de pragmatismo, caído em desgraça ainda estou para perceber porquê.
Possivelmente porque a doença se tornou rentável, lucrativa e o maior negócio do mundo, superando mesmo o dos automóveis.
Mas, nesse caso, será que ainda vamos falar, a propósito, de ideal científico?...

A SOLIDÃO DOS CRIADORES E O LOBBY MÉDICO-FARMACÊUTICO

O «contexto da descoberta», a que alude Karl Popper, é dúplice e ambíguo: tanto dá para abortar uma ideia genial que irá subverter a estabilidade de um sistema ideológico podre, como poderá, por conveniência interna, gerar uma ideia que seja útil ao mesmo sistema.
O criador isolado, cavaleiro andante na busca do ideal científico, se alguma vez existiu, despareceu completamente do mapa. Ou ficou imortalizado por Cervantes, que lhe contrapôs o pançudo Sancho. Hoje não há, em ciência médica, franco-atiradores, criadores isolados, investigadores austeros no seu covil de pesquisa. E muito menos em Naturologia, assediada por abutres de todos os lados.
Se não for a Epistemologia, com a ajuda da História da Saúde, a estabelecer novas pistas de pesquisa na ciência naturológica, o ciclo vicioso - já apertado - irá apertar-se cada vez mais. E sufocar a Naturologia.
Como o nosso professor fez notar, os obstáculos «corporativos» são, nesse contexto da descoberta, perfeitamente decisivos. Foi a tese, aliás, desenvolvida numa comunicação ao primeiro Forum de Medicina Natural: o regime corporativo que vigorou antes do 25 de Abril e do qual beneficiava a classe médica como principal privilegiada, continua, e ainda mais assanhado, no pós 25 de Abril.
As corporações acabaram e agora chama-se «lobby médico-farmacêutico».
Não há, portanto, «paciência epistemológica » que chegue para aguentar estes anacronismos da vida «científica» que continuam fazendo, para muitos de nós, a vida num inferno, nomeadamente os alunos de todos os graus de ensino. Por isso o nosso professor falou de «pressa moral».
O tempo de guerra acabou e a guerrilha deverá actuar. «Mein kampf» como alguém lhe chamou.
Raramente, este tipo de «adversidade» institucional poderá ser instigadora de criatividade. Como disse o nosso professor e como alguém também poeticamente terá glosado, não sei se Antonin Artaud (1896-1948), se Samuel Beckett (1906-1989), se Albert Camus (1913-1960) : «Tudo o que foi feito de grande, foi para sair de um cul de sac», sinónimo da máxima latina «In dolore partem...», parirás em dor.
O novo paradigma naturológico rejeita esta filosofia ancestral: o parto não tem que ser doloroso, já que a dor surgiu como desvio de uma arte antiquíssima de viver.
Basta olhar como uma gatinha tem os seus gatinhos. Alguma coisa está profundamente errada na espécie humana. E a Naturologia tem obrigação de o descobrir. Urgentemente. E não estou a referir-me só ao parto sem dor, que devia ser disciplina obrigatória nesta escola. Estou a referir uma técnica muito mais alargada da arte de viver que incluísse, obviamente, uma arte de nascer, uma arte de envelhecer e uma arte de morrer.

NÓS, OS VELHOS

A forma simpática como o nosso professor encara a função do velho na sociedade, pode ser um bom princípio para nos aproximarmos, nessa matéria, da sabedoria oriental e para valorizarmos a voz da experiência em vez de só darmos ouvidos à autoridade livresca do magister dixit, do papagaio erudito.
A longevidade, aliás, é um dos dossiês de interface holística que poderão ser propostos à Naturologia nos anos mais próximos. Ou já, dada a urgência da démarche.

ANTROPOMORFISMO: 4ª FERIDA NARCÍSICA/ FREUD NO DIVÃ DO PSICANALISTA

O tema da Queda, sublinhado nesta nossa lição, interessa directamente a Naturologia.
1º - Porque reconfirma a concepção cíclica do universo e portanto os bioritmos
2º - Porque da Queda adâmica às quedas actuais no abismo das várias crises planetárias, a famosa hominização tem sido uma carreira de obstáculos muito interessante como espectáculo
3 - Porque a crise está inscrita nos genes do Logos: e o que temos hoje, decorre apenas do que eles fizeram ontem e anteontem.
Pergunto-me se a terceira ferida narcísica de Freud inclui um surto que Edgar Morin relata, com abundância de citações, no livro «O Paradigma Perdido»: ele não utiliza a palavra mas acho que se pode falar em «antropomorfismo» que, durante milénios, alimentou todos os discursos sobre a vida e a evolução dos seres vivos. O homem sempre de bancada a assistir aos sacrifícios romanos nas várias arenas do mundo onde tem ido como caçador, conquistador, colonizador.
O homem, narcisicamente, sempre se apresentou como o ser supremo da criação, com todo o direito e poder de decidir sobre as outras espécies.
É aqui que a Minhoca pode entrar e que o senhor Freud pode voltar para anotar a 4ª ferida narcísica:
Sem a minhoca, a espécie humana não existiria.
Aliás, não existiria sem os seres mais ínfimos, como as bactérias.
Não existiria sem a clorofila.
Não existiria sem ...
Esta interdependência do Rei relativamente aos súbditos escravos seria uma bela ferida para deixar o tio Freud capaz de cair num divã de psicanalista.

O PEDREGULHO DAS MEMÓRIAS E A MUTAÇÃO ALQUÍMICA

Muito interessante a tese apresentada pelo nosso professor sobre o peso que carregamos às costas, os quilos de pedregulhos que o nosso inconsciente carrega e a que poderíamos, em sentido lato, chamar memórias.
Há hoje duas correntes que têm uma resposta provocadora a essa questão altamente provocante da epistemologia:
- uma é o budismo tibetano da Ordem Nyngma, que afirma solenemente: transmutarás as tuas energias (informações) negativas
- outra é a alquimia da vida ou gnose vibratória de Etienne Guillé, que fornece todos as ferramentas para a transmutação alquímica diária (transmutação das energias, informações ou memórias que carregamos às costas).
O «psiquismo é dinâmico» como afirma o nosso professor mas tem que ser...dinamizado ou, em linguagem mais apropriada, alquimizado.
Técnica esta que, evidentemente, se distancia anos-luz das técnicas psicanalíticas, devendo identificar-se muito mais com a tradicional cura iniciática.
As técnicas modernas reforçam o ego e portanto «a dimensão trágica do eu», enquanto a cura iniciática se destina essencialmente a dissolver o ego, raiz de todos os dramas e ranger de dentes...
A vida só é egofágica, voraz e egoísta, no contexto de «ignorância» em que nos encontramos, geração após geração. Ignorância a que o budismo chama «avidia».
Se perdemos hoje a convicção de que é possível aceder ao real - como se afirmou durante a lição - a resposta está, talvez, na ciência noológica (a criar) ou ciência das energias.
Se a energia não é o real, então todo o universo, toda a criação será uma imensa ficção e a vida um pesadelo dentro de outro pesadelo.

METABOLIC MEDECINE = ALQUIMIA ALIMENTAR

Metabolizar memórias (sacos de pedregulhos) seria a démarche que a Naturologia deveria incluir numa cadeira de ...medicina metabólica ou - porque não? - na cadeira de Bioquímica, aquela que na nossa escola mais perto se encontra de abrir as janelas à Alquimia.
E, portanto, à transmutação das energias.
Ver o tratado básico desta alquimia da vida, desta transmutação energética, nas seguintes obras de fundo:
C.L. Kervran - «Transmutations a Faible Energie» - Ed. Maloine - Paris, 1972
Michio Kushi e Edward Esko - «The Philosopher's Stone» - Ed. One Peaceful Worl Press - Massachusetts - 1994
Etienne Guillé e Christine Hardy - «L'Alchimie de la Vie» - Ed. du Rocher - Paris - 1983
Etienne Guillé - «Le Langage Vibratoire de la Vie - L'Alchimie de la Vie» - Ed. do Rocher - Paris - 1990

LIBERDADE DE ESCOLHA PARA O PACIENTE

Os conceitos de conhecimento sensorial e conhecimento intelectual, bem como o tema dos órgãos dos sentidos, são uma noção posterior ao Logos.
A única coisa a dizer numa perspectiva naturológica é esta: se o Logos nos tem governado e muita gente dele se governa, pois deixem estar o Logos. Não queremos estragar o emprego a ninguém. Mas o que se torna imperioso são alternativas a essa «ditadura» - umas vezes suave, outras vezes sangrenta - do Logos sobre a espécie. E que o princípio da liberdade de escolha não seja coagido.
«Liberté, couleur d'homme», parece que disse o poeta Paul Éluard (1895-1952) : embora a liberdade seja mais um mito do que um ideal, mas fica sempre bem, em regime de ditadura médica, invocar esse ideal.
Se - como afirmou o nosso professor - o Logos está na base da verdade, como iremos desembaraçar-nos do Logos sem ficar anatematizados como «mentirosos»?
Como dar a volta à ditadura do Logos sem ofender ninguém?
Talvez revalorizando a «doxa» que tão caluniada parece ter sido pelos detentores da «episte».
Não sei porque «aproximações contingenciais à verdade» não possam ser tão aceitáveis como a verdade absoluta da episte (que ainda por cima continua em eterna discussão se será assim tão absoluta).
Temos outra vez o exemplo da «homeopatia»?
A verdade absoluta dos absolutistas da ciência decreta que homeopatia não presta.
Mas a aproximação empírica, vivenciada, experimental e dóxica prova que resulta. De modo e maneira que vou rejeitar a doxa ( que me podia curar) e aceitar a episte (que me deixa morrer)?...
Anote-se ainda: Sofísticos, hoje, são os argumentos dos alegados cientistas e não os dos que assumem uma «doxa» empírica ou opinativa.
Uma das coisas que se pode aprender com a gnose vibratória de Etienne Guillé é que vale mais ter poucas certezas - poucas mas boas - do que muitas crenças, opiniões e teorias. Crenças, opiniões e teorias - tudo «cosa mentale» - leva-as o vento. Certezas estão inscritas no ADN molecular.

A ESTRUTURA GEOMÉTRICA DO ESPÍRITO HUMANO

Questão muito interessante e polémica levantada pelo nosso professor: «A estrutura matemática do espírito humano», defendida por alguns patriarcas da inteligência humana: Pitágoras , Santo Agostinho, São Boaventura .
À Naturologia interessa desde já, neste tema vastíssimo, saber que uma das 12 ciências sagradas - a Kaballah - tem que ser reconstruída (reconstituída).
E que as matemáticas modernas nada têm a ver com isso.
Aliás, muito linearmente, aconteceu o mesmo naquilo que podemos chamar a santíssima trindade da degradação (da Queda em sentido bíblico):
1 - A Alquimia degradou-se em Química
2 - A Astrosofia (ou Cosmobiologia) degradou-se em Astrologia kármica das feiras do oculto e etc
3 - A Numerosofia degradou-se em matemáticas modernas.
A Magia degradou-se em Medicina.

Um bom tema, este tema da queda, para a epistemologia, companheira de jornada da Naturologia.
Muito interessante este desafio: O Logos será ou não a famosa estrutura matemática e geométrica do espírito humano?
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17/11/1998

A IRRACIONALIDADE DA RATIO MÉDICA

LÉXICO HOJE OCORRENTE(Palavras-chave directamente ligadas à Naturologia são assinaladas com um asterisco *):

4 elementos da matéria *
Antropológico
Aritmolatria *
Axiomas
Ciência dedutiva
Ciência indutiva
Coincidentia opositorum
Hipótese *
Índice fiduciário epistemológico
Inteligência artificial
Mentalidade ideográfica *
Obediência computacional
Objectualidade
Racionalidade logarítmica
Realismo ingénuo
Res cogitans
Res extensa
Subjectividade
Universo *

AUTORES CITADOS:

Aristóteles
Descartes
Francis Bacon
Galileo
Giuseppe Ruggieri
Laplace
Newton
Nicolau de Cusa
Platão

SUBLINHADOS DESTA LIÇÃO:
A natureza é matematizável
Adequatio mente rei
Cogito ergo sum (o princípio do fim)
In uno multiplo verteri
O cogito está na origem do radicalismo racionalista
Razão torna-se autofágica
Vida contemplativa - ideal dos estóicos
Visão literatista do ensino

A irracionalidade da ratio médica (aquilo que a medo se vai incluindo na palavra «Iatrogénese») dá, hoje em dia, um bom exemplo concreto e infelizmente quotidiano daquilo que foi abordado na nossa aula como abstracção epistemológica : a irracionalidade da ratio em geral.
Ao enquadrar a ratio no quadro das 5 virtudes dianoéticas de Aristóteles, a epistemologia quase encontra maneira de desculpar, justificar e perdoar o rosário de crimes que hoje são imputáveis à ratio em geral e a algumas ratios em particular, nomeadamente as que mexem com as ciências que usam o prefixo «bio».
Os desmandos da ratio biocrática têm sido de tal ordem, que vieram uns senhores excepcionalmente bem intencionados ( de bem intencionados está o Inferno cheio) e criaram a Bioética.
No quadro das 5 virtudes dianoéticas aristotélicas, só uma poderá merecer alguma perplexidade, não pelo termo grego NOUS mas pela tradução em português, INTELECTO, que cheira muito a irracionalidade do cérebro direito.
Das 5 virtudes, a SABEDORIA - talvez por estar no meio das cinco - será a que merece melhor aceitação por parte do estudioso de epistemologia orientado para a Naturologia . Sabedoria , de facto, invoca a virtude do meio termo, entre Ciência e Consciência. Vale a pena repetir com Rabelais: Ciência sem consciência é ruína da alma.
Ciência médica sem consciência é ruína da vida.

EM DEFESA DO PREFIXO «BIO»

A propósito, valia a pena então defender o estudante universitário, alvo e vítima privilegiada das irracionalidades demenciais de todas as ratios ditas científicas. A maior razia, de facto, é feita no cérebro dessa amada juventude, que assim fica pavlovianamente condicionada para seguir no trilho que ao sistema mais convém. Só pela autoreprodução continuada o sistema se consegue manter. Autofagicamente mas manter.
Peço desculpa ao nosso professor José Alves mas o facto de haver, excepcionalmente, alunos que conseguem ser «bons» no meio de um sistema aberrante, não significa muito em abono desses alunos e muito menos desculpa o sistema. Se eles conseguem ser brilhantes - como assegurou o nosso professor - é porque, com certeza, gastaram a maior parte das suas preciosas bioenergias para adequar-se às besteiradas do sistema.
Para encornar em vez de pensar.
Para atrofiar uma parte do cérebro e hipertrofiar a outra.
Para fazer do seu precioso potencial vibratório de consciência um bidom de informações maior do que a Internet .
O que hoje se exige de um estudante universitário é que tenha uma memória maior do que a Internet: o que, em pleno império da dita, é algo de patológico. Para não dizer que é criminoso. Só que para estes crimes não há tribunal.
Em Maio de 1968, fecharam o que podia ter sido um tribunal para este tipo de criminalidade.
Os estudantes que se rebelaram e rebelam, querendo fazer uso da «mentalidade ideográfica» em que muito oportunamente falou o nosso professor, de certeza que foram ou serão esmagados.
Esmagados e postos «knock out», ou seja, fora do sistema, fora da sociedade, fora do sistema de emprego. Serão toda a vida desempregados do sistema, o que não é honra nem desonra mas apenas uma grande chatice.
A «mentalidade ideográfica» é o que sempre quiseram e continuam a querer alguns franco-atiradores, mas sem grande êxito prático. Toda a pedagogia escolar enfia milhões de alunos todos os anos naquilo que é o inverso (perverso) dessa mentalidade ideográfica.
No nosso curso de Naturologia Holística - onde, evidentemente, a «mentalidade ideográfica» deveria ser a única mental, tecnica e moralmente autorizada - passa-se exactamente o inverso do que devia ser: não é por culpa de ninguém, nem de professores nem de alunos. É a culpa do tal sistema, que é hoje, mais do que nunca, global e totalitário. Os jornais falam hoje muito de «globalização»: devem querer dizer que quando o barco se afundar, vamos todos, responsáveis e não responsáveis pelo afundamento, vamos todos ao fundo.

OS ALFABETOS SAGRADOS

Se ainda há palavras lindas numa língua profanizada como a língua portuguesa, UNIVERSO é com certeza uma delas. E valia a pena saber em que nível de frequência ela vibra.
Universo é o uno do diverso: só por si a definição da palavra holística. A palavra «holística» já era corrente na astrologia medieval. O latim «In uno multiplo verteri» tem, evidentemente, outro sabor e não é o mesmo que a sua tradução em português, «verter o múltiplo no uno».
Como teckne não é o mesmo que arte, episte não é o mesmo que ciência, fronesis não é o mesmo que sabedoria, sofia não é o mesmo que sapiência, nous não é o mesmo que intelecto.
Traduzir é sempre trair.
Recorrer às palavras latinas - como o nosso professor tantas vezes faz - não é mero artifício académico ou didáctico: corresponde a uma profunda ressonância das nomenclaturas que se encontram mais próximas da origem, o que é o caso do alfabeto grego e do idioma latino.
Diga-se, no entanto, que três únicos alfabetos se podem hoje considerar sagrados: o sânscrito, os hieróglifos egípcios e os ideogramas hebraicos.
Uma coisa isto prova: a famigerada dicotomia, hoje em voga, entre letras e ciências - como se se estivesse a separar o trigo (ciências) do joio (letras) - , vem de longe e tem raízes. A coisa começou a aquecer, de facto, quando os alfabetos mais próximos da língua primordial começaram a cair em desuso. «Língua morta» foi o anátema lançado ao Latim. E pronto. Enterrou-se o cadáver e foram todos muito contentinhos da silva para uma de ciência experimental.
Já espreitava a nova e segunda babel das linguagens particulares, das cifras indecifráveis, dos códigos secretos só para eleitos. Basta dar uma vista de olhos pelas nomenclaturas do nosso primeiro ano - bioquímica, biologia celular, botânica, anatomia, farmacognósia - para compreendermos perfeitamente onde a ratio virou a pura irracionalidade.
Onde a Alquimia se degradou em Química e Bioquímica.
Onde a Kaballah e a Numerosofia pitagórica se degradou em matemáticas «superiores».
Onde a Física das Energias ou Noologia se degradou em Física atómica ao serviço da destruição maciça e individual.
Onde a Alquimia da Vida e a Magia se degradou em biocracia médica das transplantações e da Iatrogénese.

A lógica performativa tem a sua arma principal nos códigos secretos das especialidades: ao corpo de elite - guarda pretoriana - que vigia policialmente esses códigos (e os faz render chorudos lucros) chama-se corpo de especialistas, cientistas, investigadores, etc. Ou, de um modo geral, «comunidade científica», entidade a que todos, regra geral, tiram reverentemente o chapéu.
A vantagem de um curso universitário para um homem vulgar, nem demasiado esperto nem demasiado estúpido, é colocar na frente desse homem vulgar a figura do seu Inimigo Principal.
Por acaso, a famigerada «língua morta» que é o Latim, volta a galope aos escaninhos dos nobres cientistas quando querem baptizar, com nomes de rigor - universais, digamos assim - as espécies vivas. Mas nessa época dos nomes latinos dados aos nossos irmãos animais e às nossas irmãs plantas, ainda a ciência não tinha entrado na demência paranóica e paroxística a que chegou hoje. Dividindo, dividindo, dividindo para continuar reinando.

ANTES DA VERGONHA MODERNA

A taxinomia (ou taxonomia) das espécies continua a ser um bom exemplo de que nem sempre a Ratio conduz à irracionalidade demencial. Aliás, se há época em que apesar de tudo a ciência ainda não tinha mostrado as fauces e em que pacificamente se podia filosofar sobre a ciência sem vomitar, é esse fim de século passado, em que imperou a «filosofia científica».
Quando quero ler discursos sobre a ciência sem me envergonhar de pertencer à espécie humana, vou aos meus queridos autores: o biólogo Pierre Lecomte de Nouy (1883-1947), o biólogo Félix le Dantec ( 1869-1917), o cirurgião e fisiologista Alexis Carrel (1873-1944), A. Dastre, Maurice Vernet, Paul Gaultier (que dirigiu na Flammarion a preciosa Biblioteca de Filosofia Científica), Maurice Pradines, Emile Boutroux, Alfred Still, Georges Lakhovsky, Luiz Buchner.
Ou mesmo Charles Darwin e Ernesto Haeckel, cujo aspecto mais detestável é terem parido uma ninhada de epígonos que nos têm moído a paciência neste século e principalmente neste fim de século em que, à conta da aceleração histórica, tem acelerado também a irracionalidade neurótica e psicótica da tal ratio.
Dos nomes acima enunciados, a maior parte não merece a honra sequer de figurar nas enciclopédias do sistema.
Este gueto das enciclopédias é um episódio muito curioso da telenovela chamada «irracionalidade da ratio».
Um indesejável da ciência será sempre excluído das ditas enciclopédias, que fazem e desfazem reputações, um pouco ao estilo das sondagens, best sellers e prémios mais ou menos Nobeis.
Podíamos elencar (como diz a nossa querida professora de Botânica) uma lista desses nomes indesejáveis e provavelmente iríamos lá encontrar o melhor lote de epistemologistas. Crítico radical da ciência não irá nunca parar às enciclopédias do sistema. Já dizia a minha avózinha e tinha toda a razão.
A menos que lhe seja dado, por engano, o Prémio Nobel (é o caso de Alexis Carrel, esse patriarca da Biomedicina ) ou por qualquer outra ocorrência do acaso, cientista crítico da ciência vai para o gueto do silêncio.
Enquanto não meterem o Etienne Guillé nas enciclopédias e no chafurdo da Internet, vou dormir tranquilo.
No dia em que tal acontecer, é porque já mudou muita coisa e a ratio começou a recuar nas suas traquibérnias de irracionalidade.

PONTO DE VIRAGEM

Falando das armas que a ratio tem à disposição para se tornar irracional até dizer basta, uma outra, citada na aula, deve ser sublinhada: a «aritmolatria» ou idolatria do número ou a sacralização do número, dá pano para mangas. Encurtando razões, basta lembrar que essa aritmolatria é a degradação moderna da numerosofia pitagórica e que a classificação do Roger Bacon ( 1214-1294) sobre os idola tribu já previa essa e todas as idolatrias modernas da Ratio em desvario.
Vale a pena voltar a esse monge franciscano do século XIII, mesmo que não tenha sido ele que falou dos «idola tribu»... A reabilitar, como parece que está a ser reabilitado o cardeal e bispo Nicolau de Cusa (1401- 1464). Esta reabilitação do Nicolau, no entanto, pode levar água no bico, já que, segundo uma enciclopédia, ele teria sido, com a sua cosmologia infinitista e anti-aristotélica, o precursor das concepções da física moderna.
A ratio moderna tem sempre uma avidez canina pelos tenros precursores, nomeadamente se bispos e cardeais, pois bem precisa de se enfeitar com transactas glórias.
A propósito de precursores recuperados pela moderna intelligentzia, um caso a estudar com afinco pela epistemologia e que diz directamente respeito à medicina holística que um curso de naturologia preconiza, é o de Fritjfof Capra, com duas obras em língua portuguesa e os editores já a disputar os direitos de o publicar: «O Tao da Física» ( Presença, 1989) e «O Ponto de Mutação» (Cultrix, São Paulo, 1982) são dois títulos de leitura obrigatória num curso de Naturologia: o primeiro - «The Tao of Phisics» - porque um físico atómico se presta ao papel de vir dizer que no taoísmo já estava dito tudo aquilo que a física moderna veio a descobrir com grande estrondo de foguetes; no segundo título, - «The Turning Point», conspecto histórico das doutrinas que nos levaram da racionalidade à irracionalidade, podemos encontrar aberta a porta para entrar no paradigma holístico e ocuparmos lá o lugar a que temos direito. Como estudantes de Naturologia mas principalmente como seres humanos.
Qualquer dia já temos o Fritjof Capra nas enciclopédias. Por enquanto e apesar de eminente físico atómico, continua de quarentena. Por enquanto só o cineasta Frank Capra está em todas...
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1-4- episte12>

LIÇÃO DE 18/11/1998: O REGRESSO DO BOM SENSO
E AS INQUISIÇÕES MODERNAS/LÉXICO:

Austeridade da razão
Bios teoreticus
Diferencialidade *
Intuição platónica
Temporalidade
Topografia interior

AUTORES:
António Machado (1875-1939)
Blaise Pascal (1623-1662)
Giordano Bruno (1548-1600)
Helmut Plesner
Max Weber (1864-1920)
Platão(427 a C- 347 a C)

SUBLINHADOS:

In errore aliquid veritatis.
Não é razoável que eu me mate de tanto pensar.
Não há coisa mais perigosa do que não fazer o que tem de se fazer no momento em que as coisas têm de ser feitas.
O homem é uma excedência de sentido
O homem nunca coincide consigo mesmo
O homem precisa do outro
O homem vive num permanente fieri
O pensamento atropela as palavras
O sonho impulsiona a vida
O universo fica sem centro
Vida é abstracção, o que há é seres viventes.
Vivido está, vivido sou.

19/ Novembro/1998 - Razoabilidade será a primeira palavra a sublinhar nesta nossa lição de Epistemologia.
Palavra à qual eu gostaria, desde já, de contrapor um dos seus termos adversos: livresco. A ratio, hoje, tomou o freio nos dentes, principalmente na área institucional onde está mais à vontade para exercer o seu despotismo nem sequer iluminado.
Essa área é a escola, nomeadamente a escola dita superior, onde a neurose livresca atinge as raias do perfeitamente obsceno.
A razoabilidade, em vez do livresco dominante, é o que tem faltado à medicina moderna e, por isso, chegámos aos apuros de insensatez, que Ivan Illich (1926- ), no seu livro «Nemésis Médicale», definiu de modo lapidar: «A medicina moderna produz mais doenças do que as que diz curar.»
O termo razoabilidade que a epistemologia sugere, já se contém afinal em duas coisas do conhecimento vulgar e empírico: o bom senso e o senso comum, qualquer dos dois menosprezado pela classe intelectual e por todas as classes no poder.
A insensatez, pelos vistos, é extremamente rentável para o poder, nomeadamente o poder universitário em geral e o poder médico em particular.
Michio Kushi, nos seminários que deu em Portugal, quando as pessoas se mostravam atrapalhadas com o yin-yang alimentar, respondia pura e simplesmente: deixem-se guiar pelo bom senso, bússola para viajar no quotidiano. O bom senso, claro, inclui intuição, instinto e imaginação. E uma enorme paciência epistemológica para aturar os livrescos de todos os matizes e a irracionalidade de todas as ratios.
Não me admiro nada que essa neurose do livresco fosse a última besta do Apocalipse, coma as profecias avisaram.
A razoabilidade inclui todos os parâmetros que a psicologia viria a dividir mas que, inicialmente se encontravam unidos no coração humano: intuição, instinto, imaginação, sentido lúdico, emoção, sonho, experiência vivida, praxis existencial, concreto quotidiano, coisas que se foram perdendo, não só porque o império da razão ainda é mais destrutivo do que o império dos sentidos, mas porque as condicionantes sociais exercem uma enorme pressão para artificializar a vida quotidiana: o mercado gira sobre artefactos, não o esqueçamos. Artefacto e artifício andam perto.
Pedindo desculpa deste registo psicologista ao nosso professor José Alves, valia a pena perguntar porque é que a epistemologia, como ele já deu a entender, minimiza o registo psicologista e o registo sociológico. Parece haver um certo ciúme entre especialistas de diferentes ciências...
E o registo antropológico, sempre aqui tão dominante?

PENSO, LOGO NÃO EXISTO

Quando o professor nos diz «vivido está, vivido sou», está a dar-nos a afirmação inversa do cartesiano «cogito». E está a aproximarmo-nos de um registo existencial/existencialista, que a epistemologia académica também parece não admirar lá muito.
Das componentes que integrariam a razoabilidade, destaco uma que me parece problemático lá meter: a do irracional. O irracional tem conotações que podem ser politica e antropologicamente perigosas. Mais cauteloso é falar de a-racional.
Sem esquecer que o irracional já é uma derivante semântica do racional: é como se o racional se quisesse continuar a impor pelo seu contrário. É como se o racional fosse a parte positiva e simpática e o irracional fosse a face caótica e antipática. É como se entre racional e irracional não houvesse terceiro termo ou alternativa.
Quando um belo dia o senhor Gyorgy Lukács (1885-1971) acordou mal disposto e começou a acusar de «irracionalismo» o individualismo de Nietszche e de este ser o responsável pelo totalitarismo nazi-fascista, estava a fazer uso (e abuso) dessa ambiguidade que a palavra irracionalismo carrega.
Só o escritor e filósofo francês Gabriel Marcel (1889-1973), anos mais tarde, viria a pôr ordem nesta bagunça de inspiração marxista-leninista, chamando aos bois pelos seus nomes e responsabilizando a neurose tecnocrática pelos crematórios nazis.
A razoabilidade não precisa de ser irracional nem racional mas apenas o que é: razoabilidade.

O DIREITO À DIFERENÇA

A registar também nesta lição com vista ao horizonte naturológico do ano 2000, é a diferencialidade ou «direito à diferença» como os ecologistas dos anos 70 proclamaram e como o sociólogo e filósofo marxista Henri Lefèbvre (1901- ), numa abertura rara em marxistas, escreveu no célebre «manifesto diferencialista».
Aí está um princípio - o diferencialismo - que continua no limbo da utopia, quando a massificação está a atingir o ponto de saturação e de não retorno. Nada impede que os ecologistas continuem a ladrar no deserto e a defender o «direito à diferença». Se formos a ver, é um direito que não está inscrito na Constituição da República mas nas impressões digitais de cada um. O que até serve para borrar o dedo no Arquivo de Identificação, único momento em que a sociedade se interessa pela nossa inviolável identidade.

AMAR SEIS VEZES (MENSAGEM DA ESFINGE)

Quando se inclui o amor na razoabilidade humana está-se a meter o rossio na betesga. O amor tem para os egípcios, na mensagem da esfinge, uma sêxtupla valência. Tudo indica que os hierofantes foram os únicos a saber o que era isso.
Nas sociedades ocidentais, que usam e abusam da palavra amor - assim como agora se usa e abusa da palavra «espírito» - vê-se bem com que ignorância o fazem.
Amor seria a emergência total e global de todo o potencial vibratório humano no dia em que o ser humano desenvolver todo esse potencial.
Amor poderia ser, em alquimia básica da vida, sinónimo de pedra filosofal.
O que, não sendo impossível, continua no entanto um pouco distante...

DISCORDÂNCIAS

Peço desculpa ao professor José Alves de uma discordância : «o aspecto exterior será ou não negligenciável?».
Respondo por mim: acho que é totalmente negligenciável. E enganador. Se há arte que os artifícios e artefactos da sociedade consumista/hedonista conseguiram requintar é a arte do disfarce, da cosmética, da aparência de santo com coração de crocodilo.
O que nunca engana para um observador preparado é o seu «aspecto» energético, aquilo a que os gurus de hoje em dia chamam «aura» e outras parlapatices.
Imagem energética de cada qual, essa sim, é que não é nada negligenciável para quem tenha que se defrontar, como terapeuta, com as dissimulações mais habilidosas a que a doença pode conduzir o ser humano em sofrimento.
Outra discordância: a conotação pejorativa com que se falou do trabalho físico e até do trabalho intelectual. Há efectivamente uma foçanguice no trabalho mas ela faz certa diferença do trabalho por necessidade e do trabalho escravo sobre o qual se erguem os esplendores das nossas tão queridas democracias.
«O Elogio da Preguiça» é um ensaio muito curioso de Paul Lafargue que os ecologistas dos anos 60/70 também puseram em voga. Na Segunda Idade de Ouro que está a nascer, não é a preguiça nem o trabalho a dominar mas a emergência criadora do ser humano, que é, aliás, bastante trabalhosa.
Interrogo-me sobre uma enorme dúvida que o nosso professor vai, com certeza, esclarecer proximamente. Havendo, no seu discurso, uma série de palavras aparentemente sinónimas, será que o são mesmo ou representam variantes significativas do mesmo?
São essas palavras:
Fronesis
Intelecto
Logos
Mente e mental
Nous
Pensamento
Ratio
Razão
Gostei de saber que o capitalismo nascera com o calvinismo e que foi autor da tese o respeitável sociólogo alemão Max Weber ( 1864-1920).
Se a ciência moderna parece virada para aquilo que desprezou e muitas vezes condenou à morte ou à masmorra - o Cosmos - e se Giordano Bruno (1540-1600) e Blaise Pascal ( 1623-1662) se encantaram com os espaços infinitos, ocorre que tudo isso se afigura um esforço de cosmética do racionalismo.
Temos de lembrar que o apelo à unidade é hoje a heresia mais perseguida no seio da comunidade científica. O que torna a abordagem holística de uma quase sobrehumana dificuldade, como facilmente se pode constatar nesta Escola de Naturologia.
Dividir para reinar continuará a ser o lema do poder e do establishment.
A Biocosmologia - interdependência entre micro e macrocosmos - é totalmente ignorada da ciência moderna e da ciência clássica, porque pura e simplesmente separou o micro do macrocosmos, fazendo disso a sua glória suprema.
Foi o momento de a Astrologia tomar o lugar que a ciência não quis nem soube ocupar.
Biocosmologia ou Cosmobiologia, queira ou não a ciência, é para aí que tudo caminha. O resto são fantasias quânticas de especialistas quânticos com medo de perder o emprego.
Unir o céu à terra seria a grande heresia no seio da ciência. Se Giordano Bruno foi parar à fogueira, o que poderia acontecer hoje quando as inquisições «soft» se tornaram mais sofisticadas e eficazes do que nunca?
+
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LIÇÃO DE 2/11/1998

AS TEORIAS DA VIDA E AS TEORIAS CONTRA A VIDA/ LÉXICO DESTA LIÇÃO:

Convencionalismo
Fixismo *
Homo logaritmicus
Intellectus = intus + legere (capacidade de harmonização dos contrários) *
Metafísica
Noosfera *
Polisemia difusa
Ratio inveniendi

AUTORES CITADOS NESTA LIÇÃO:

Charles Darwin
Edouard le Roy
Gabriel Garcia Marquez
Gaston Bachelard
Henri Poincaré
Jean Marie Domenach
Karl Popper
Lamarck
Nicolau de Cusa
Pierre Maurice Marie Duhem (1861-1916)(«Teoria Física» )
Pierre Teilhard de Chardin («O Fenómeno Humano»)
René Girard
S. Boaventura
Santo Agostinho

SUBLINHADOS DESTA LIÇÃO:

A metafísica funciona como arma secreta do espírito humano.
A nobreza ontológica do homem em relação aos demais seres.
A verdade está na ponta do bisturi ( positivismo)
As teorias são apenas convenções
As teorias são fruto da imaginação
Cemitério, lugar de vida
Ipsum verum factum est (É no fazer que está a verdade)
Nada se perde, nada se cria, tudo se transforma
Nullus effici beatus nisi supra semetipsum ascendat( ninguém se torna feliz se não se superar a si próprio) - S. Boaventura
O fetichismo dos dados
O homem é um ser axiotrópico
O homem tem uma forte tendência para a cafrealização
O índice incoativo da inteligência animal
Os valores brotam do coração

3 / 11/1998 - O convencionalismo de Jules Henri Poincaré (1854-1912) e Pierre Maurice Marie Duhem (1861-1916) tem consequências que só modernamente se podem avaliar em toda a sua extensão e gravidade.
A adequabilidade
a verosimilhança
a aceitabilidade
de uma teoria podem levar (e têm levado) a todas as loucuras.

Um problema prévio deve, no entanto, ser levantado, ao falar de teorias e do carácter «convencional» das teorias.
Mais uma vez, percorrendo uma relativamente vasta bibliografia, verifica-se que a epistemologia - e os epistemólogos mais em destaque - ocupam-se normalmente das ciências físicas, enquanto as ciências humanas e as ciências biológicas parecem estar ausentes das suas (deles) preocupações.
O que não deixa de ser estranho e, para um curso de Naturologia, trágico.

OS 4 CANCROS MODERNOS

Em ciência da vida (a chamada bio-logia) onde a devastação operada pelo chamado método científico tem sido total, há um silêncio de morte por parte dos críticos, analistas e epistemólogos.
No entanto, é nas ciências da vida (a chamada bio-logia) que os 4 cancros modernos do método científico têm proliferado de maneira incontrolável:
a) o cancro da nomenclatura, sempre em escalada logarítmica para a supercomplicação
b) o cancro do especialismo , sempre em escalada logarítmica (inflacionária) para o super-especialismo
c) o cancro das teorias que, exactamente pela sua verosimilhança, adequabilidade e aceitabilidade são, em ciências da vida, as mais perigosas.
d) o cancro das bibliografias exaustivas que ninguém jamais consultou ou consultará.

A do evolucionismo, única teoria das ciências da vida que os epistemólogos costumam citar, é uma delas: o evolucionismo é totalmente falso, do princípio ao fim, no entanto granjeou o apreço das massas e das elites exactamente porque se baseia numa certa «racionalidade», como observou o nosso professor.
«A Origem das Espécies», que , segundo as más línguas, foi livro de cabeceira de Hitler, Mussolini e parece que de Estaline (se acaso eles sabiam ler), adequa-se perfeitamente à praxis da luta de classes do bloco de Leste e à maratona capitalista do competitivismo do bloco ocidental. A sociedade que tem nas olimpíadas o seu símbolo mais carismático e a sua dinâmica razão de ser, tem no evolucionismo a sua religião de chambre e no Charles Darwin o seu guru.

Mas nem só o evolucionismo tem permitido à Biocracia moderna legitimar alguns dos seus crimes mais monstruosos e hediondos. Há mais :
a) A teoria microbiana do senhor Louis Pasteur, que ele próprio repudiou no fim da vida;

b) A teoria do vírus, de um senhor que não foi mas bem podia ter sido Luc Montagnier, cuja equipa do Instituto Pasteur inventou dois vírus da sida (e que também já veio desmentir-se em público).

Um caso interessante é o da teoria da hereditariedade, obviamente uma teoria que corresponde a factos ( e deixa por isso de ser teoria) mas que levou a medicina a adoptar um dos seus pilatismos mais usuais com que tenta legitimar a sua monumental ignorância: quando não sabe ou não lhe convém saber a causa causal ou ambiental (exógena ou endógena) de uma doença, manda as culpas para a hereditariedade, o que é, além do mais, uma lapalissada de todo o tamanho: todas as doenças, em princípio, são e não são hereditárias.
A sofisticar este gesto de pilatos veio a teoria genética: hoje a genética transformou-se num catálogo de doenças, no qual catálogo a ignorância médica encontra sempre um produto que lhe convém para explicar as doenças inexplicáveis (leia-se aqui que doenças inexplicáveis, para a medicina, são normalmente as doenças que ela produz, pelo fenómeno igualmente ignorado da iatrogénese).
Com a ajuda sempre diligente da comunidade científica, que de mafiosa não tem nada , a sociedade lá vai triando as teorias da vida que interessam aos seus objectivos de morte e aos objectivos de uma indústria da doença que logaritmicamente se ocupa hoje unicamente em aumentar os lucros.
Esquecendo, claro, aquelas que de facto servem a vida embora sejam pouco ou nada lucrativas.

QUANDO AS TEORIAS SE TORNAM PERIGOSAS

O problema das teorias é serem contra o real e não divorciadas do real. As mais perigosas, em ciências da vida, são precisamente as mais verosímeis, como a do vírus é bem o exemplo.
Se, nas ciências físicas, uma teoria errada é apenas mais uma onde tem havido tantas, nas ciências da vida, como a prática médica infelizmente confirma, tem consequências trágicas.
A fraude da medicina moderna baseia-se exactamente nessas teorias fraudulentas e a Naturologia não poderá avançar se receber, precisamente e sem crítica, essas teorias que dominam toda a patologia e toda a terapêutica.
Será, num curso de Naturologia, o nó górdio mais difícil de desatar.

IATROGÉNESE QUÍMICA E RADIOACTIVA

Onde, precisamente, o princípio do intellectus (inter+legere) faz mais falta - nas ciências da vida - esse princípio é completamente esquecido, enquanto nas ciências físicas permite a aparente tranquilidade que se goza nessa área.
À parte o nó górdio da radioactividade e das radiações ionizantes, que acaba por incidir, em cheio, nas ciências da vida (a vida é sempre a primeira e a última a pagar todas as culpas de todas as várias e desvairadas ciências ) a ciência física é um oásis.
Já a química , no que respeita à sua incidência sobre a célula viva, é outra vez a guerra permanente.
Não duvido que os químicos tenham trabalhado em teorias certíssimas. No entanto, foram essas teorias certíssimas que fizeram do mundo moderno - afogado em merda química e radioactiva - o tremedal que é.
Ninguém pode dizer, por exemplo, que os medicamentos não são baseados numa teoria certa e que não se destinam ao bem da humanidade.
Ninguém pode dizer que a farmacognosia não está certa da 1ª à última das suas 1500 páginas.
Os efeitos dos fármacos na célula viva - iatrogénese médica - é que nem sequer se discutem... Tabus e dogmas religiosos não se discutem.
De vez em quando fala-se do episódio Talidomida. Os jornais vão falando de outras talidomidazinhas. Mas a maior parte das talidomidas continuam no mercado, sem que ninguém suspeite das novas doenças que estão fabricando. Novas doenças que a teoria da hereditariedade vai atribuir aos bisavós do doente e a teoria genética ao gene 1051 que - acaba de se descobrir - é responsável pela doença do doente!!!

BIOQUÍMICA E BIOFÍSICA TAMBÉM SE BALDAM

Suposto era que a Biofísica e os biofísicos, bem como a Bioquímica e os bioquímicos, dessem - como interfaces interdisciplinares entre ciências - algum contributo ao conhecimento da verdade.
Nada de novo nessa frente, porém:
a) os instrumentos utilizados não conseguem detectar a alma (a bioenergia) na ponta do bisturi
b) Não podendo os instrumentos limitados descobrir o ilimitado da vida e do ser humano , como é óbvio, os biofíscos e os bioquímicos viram-se para dentro do limitado e estudam o seu gueto de estimação, transformando cada vez mais num gueto a ciência que produzem.
Gueto de luxo mas gueto, hoje, a Bioquímica e a Biofísica traduzem o autismo da neurose que ataca, de lés a lés, a comunidade científica, nomeadamente se está no campo complexo da vida e não nos serenos acimentados das ciências físicas e matemáticas, vias rápidas para lado nenhum.
Desgraçadamente, seriam a Bioquímica e a Biofísica dois contributos à ciência médica moderna, cujo destino só podia ser o daquelas duas ciências auxiliares: o gueto, promovido a campo de concentração.

AS TEORIAS ABANDONADAS PORQUE SERVIAM A VIDA

Entretanto, foram minimizadas , esquecidas e marginalizadas teorias que poderiam (e vão poder) servir o homem do novo paradigma.

Cito, por exemplo, o esquecido Rudolfo Wirchov (1821-1902), patologista e antropologista alemão, autor de uma «Patologia Celular» que ainda está por descobrir mas que permanece embargada pela censura médica, já que nela se detectam os primeiros princípios da nova medicina ortomolecular, ou antes, a lógica ortomolecular em medicina.

O microbiologista russo Elijah Metchnikoff ( 1845-1916), podia ter sido um fundador das ciências da Imunidade, se a instituição (Instituto Pasteur) e depois o Prémio Nobel (que compartilhou com Paul Ehrlich( 1854-1915) não o tivessem aliciado e desviado do bom caminho.

Outro esquecido é Georges Lakhovsky, com a teoria da electricidade da célula, onde estão os germes da nova medicina vibratória, de que hoje são dois ramos adultos a Gnose Vibratória e a medicina antroposófica.

Também esquecida e igualmente marginalizada foi a teoria vitalista, doutrina segundo a qual os fenómenos vitais derivam de forças e propriedades específicas, estando coordenados por uma força especial, chamada «força vital» e não dependem apenas das forças ou leis físico-químicas.
Apesar de ser uma teoria defendida por alguns craques - Aristóteles, escolásticos, Claude Bernard (teoria da directriz) , Barthez, J. Grasset, René Berthelot e Brunschvicg, apesar de tão boas credenciais, o vitalismo caiu no esquecimento, confirmando que a maior heresia no seio do cientifismo esclerosado é tudo o que aponte para o global e holístico da vida .
Pouco lucrativo, o vitalismo irá hibernar até que as condições cósmicas o exijam de novo cá fora.
Poderá dizer-se que renasceu com a teoria (a que eu prefiro chamar proposta de trabalho) dos campos de morfogénese cósmica de Rupert Sheldrake, talvez a mais esplendorosa das teorias actuais e que foi decisiva no «boom» da medicina vibratória.

A teoria do orgone, heroicamente defendida por Wilhelm Reich, tem a biografia atormentada do seu autor. Acabariam, teoria e autor, numa masmorra psiquiátrica norte-americana. Lendo Wilhelm Reich, um dos pensamentos mais lúcidos, provocadores e estimulantes do mundo moderno, temos a sensação de que ele marrou, toda a vida, contra as paredes da caverna, pressentindo que a luz e os pássaros estavam do outro lado da parede mas sem conseguir sair do buraco escuro.
Deixou-nos Reich a teoria do orgone, traduzindo, por outras palavras, o ki protochinês e o prana hindu.

O mesmerismo, teoria de Franz Anton Mesmer (1734-1815) veio até à actual «hipnose regressiva», equívoco que parte da medicina adoptou sem grande sucesso.
Nada impede que a hipnose continue a grassar, como praga, no meio das terapias alternativas. Tem o seu quê de violência mal controlada que agrada à mentalidade médica, estruturalmente violenta.
Outro caminho do mesmerismo iria, via Charcot ( 1825-1893), médico francês fundador da neurologia moderna, desembocar numa hipótese bem mais interessante - o magnetismo animal - igualmente esquecida e marginalizada. No entanto, o magnetismo animal é outro nome para dizer o mesmo : ki, prana ou bionergia.

Entretanto e proibidos pelos polícias do cientifismo de estudar e ter acesso à «força vital» ou bioenergia, os ocidentais começaram a demanda do que outras tradições tinham dito, com outros nomes, da mesma força vital ou bioenergia, descobrindo então a acupunctura, o yin yang taoísta, o chi kung, os chacras e outras coisas.

AS ETAPAS DO MÉTODO

A restante temática sugerida pelo convencionalismo de Henri Poncaré e Pierre Maurice Marie Duhem (1861-1916), está nos livros:
A hipótese funciona como a fase dinâmica e prospectiva nas 4 fases do método científico Sem hipótese, a investigação não avança para a verdade.
Hipótese é a entrada da criatividade e da imaginação no reino do inerte dos dados observados (Observação: 1ª fase do método científico) .
Mas o que se verifica hoje em dia é que a medicina embarga todas as hipóteses que nos podiam libertar das suas garras. O problema de um curso de naturologia, joga-se exactamente nessa 2ª fase do método científico: a hipótese.
Não haverá nova medicina sem novo paradigma e não haverá novo paradigma sem novas hipóteses que possam dar a reviravolta de 180 graus que se exige.
A merda, no método científico, é mesmo quando, dada a verosimilhança, adequabilidade e aceitabilidade da teoria, ela passa a lei. Não tarda então um minuto que a lei não passe a dogma e a ciência a religião.
Além disso, lei traz a carga semântica da ordem e da autoridade policial. Lei lembra tribunais, polícias, cães-polícia, juízes e advogados. Lei é lei, dura lei.
O panorama moderno de hecatombe nas bio-logias, deriva de leis que se transformaram em dogmas. Dogmas de que a medicina é a inexpugnável igreja.
Já no domínio da anedota, surgiu muito recentemente a teoria do caos para «estudar sistemas muito complexos» (sic).
Tal como os antibióticos (de espectro largo ou estreito) têm o nome com eles, esta «teoria do caos» tem o nome com ela.
A intervenção do computador - e das imagens em computador - denuncia que esta teoria veio dar alento à «virtualização» do real que tem vindo a invadir, como lepra, o campo do real.

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