domingo, dezembro 28, 2008

CRÍTICA 1991

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sábado, 25 de Janeiro de 2003
[23-4-1991]


NA CRÍTICA DOMINANTE

Em matéria de modas literárias, há um sectarismo, expresso ou latente, na crítica dominante :

é proibido -- decretam eles -- escrever assim, porque tem que se escrever assado
é proibido fazer ficção com a história ou história com a ficção
é proibido abordar zonas demoníacas, transcendentes, místicas, metafísicas ou surreais da realidade, em nome do realismo pequenino e de via reduzida
é proibido manifestar simpatias ideológicas (apenas piedosas) pelo ambiente, que tem más tradições no nazismo alemão e no seu ideal de limpeza total e a qualquer preço
é proibido escrever em registo «kitsch» e com frases feitas, jogos de idioma, reconversão de discursos menores, perspectivas de escala que não sejam a do homem ocidental, branco, culto, poderoso, rico e com pratas na mesa da casa de jantar
é proibido praticar a «crítica impressionista», porque a crítica científica já distribuiu regras regulamentares por todos os sítios onde se analisam livros
é proibido não ser realista segundo a receita da escola neo-realista
é proibido glosar e gozar os discursos menores e os léxicos subdesenvolvidos
é proibido escrever versos com rima
é proibido escrever modernista desde que chegou o pós-modernismo, é proibido ser pós modernista para os críticos que ainda são modernistas, etc
é proibido glosar e gozar os discursos menores e os léxicos subdesenvolvidos
é proibido usar a primeira pessoa do singular em qualquer narrativa que se queira de ficção
é proibida a confissão autobiográfica, usar a primeira pessoa do singular, eu, eu, eu, excepto...
é proibido não adoptar cada género no seu género, estanque, cada regra na sua lei, cada prescrição no seu regulamento, conforme o regimento ordenado pelo crítico em exercício, excepto se o crítico decretar o contrário
é proibido, enfim, ser escritor fora dos mandamentos da santa madre instituição
Mas tudo isto é proibido, apenas, até ao momento em que a douta instituição, através dos seus ideólogos de serviço, não der ordens para que seja tudo exactamente ao contrário: quanto mais autobiográfico, kitsch, surreal, demoníaco, místico, melhor.
As modas mudam, neste reino flutuante, todos os anos. Quanto menos personagens, intriga e suspense, melhor! Até à próxima época.

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